sábado, setembro 30, 2006

Medo nos EUA

Continuando a reportagem do Globo Reporter

A prosperidade passou ao largo. Foi embora rio abaixo. Antigas mansões abandonadas e fábricas fechadas falam de um passado que não volta mais. Riverside, a dez minutos de Filadélfia, é uma cidade dormitório. De 8 mil habitantes, mais de 3 mil são brasileiros que foram em busca de tranqüilidade e aluguéis baratos. As poucas lojas do lugar exploram a saudade de um distante país tropical.
A população americana é branca, pobre, desempregada. Os jovens são punks, racistas e agressivos.
Riverside é um lugar que parou no tempo. A economia da cidade girava em torno de uma fábrica de relógios, que fechou. Nos últimos cinco anos, milhares de brasileiros foram morar em Riverside. Reergueram a economia da cidade e agora estão sendo perseguidos e forçados a ir embora.
A proprietária de um salão de beleza Aparecida Guedes, a Cida, está tendo que fechar o estabelecimento por falta de clientes. Vai perder tudo o que ganhou em anos de trabalho duro nos Estados Unidos. "Foi muita luta para chegar até aqui e me desfazer de tudo assim, à toa. Estou muito mal", conta Cida.
Para expulsar os brasileiros, Riverside adotou uma lei: multa de US$ 1 mil para quem dá emprego ou aluga residência a imigrantes sem documentos. Na maioria, os brasileiros entraram pelo México, não têm documentos americanos.
Suzanete Silva chegou de Mato Grosso há cinco anos e meio. Hoje tem uma pequena empresa no setor de limpeza doméstica. Mas tem que sair da casa onde mora.
"Para mim é insustentável, muito difícil. Mas se não tiver outro jeito... Quem está no Brasil não tem noção. A dor e a solidão são imensas. Você ganha dinheiro porque quer ir para o Brasil com estabilidade. Eu vim para ser dona de mim", diz a empresária.
Os imigrantes de Riverside foram à rua protestar e enfrentaram uma multidão de americanos enfurecidos, que pediam que fossem embora. Até a bandeira racista do sul dos Estados Unidos apareceu.
A jovem Andréia Rocha, que chegou do Rio para estudar, estava na manifestação. "Eles me vaiaram, me xingaram, me agrediram verbalmente. Eu me senti péssima. Não me sinto inferior, mas me sinto humilhada de certa forma. Porque eu estou aqui estudando, quero melhorar minha vida e tenho meus objetivos. Não estou aqui para ficar ouvindo desaforo de ninguém", desabafa Andréia.
O empresário americano David Verduin lidera uma coalizão de empresários americanos e brasileiros que entrou na Justiça contra a lei antiimigrante de Riverside. Ele morou 20 anos no Brasil e se considera brasileiro de coração. Também sofreu ao ver os brasileiros serem ofendidos.
"Nós ficamos chorando porque eu vi o ódio. Isso é triste, muito triste", diz David. O empresário acredita que a lei vai ser derrubada na Justiça.
Cerca de mil brasileiros já foram embora de Riverside. Mas a maioria ainda está na cidade. O goiano Sérgio Fallone abriu um restaurante há dois anos. Para ele, mais do que racismo, os americanos têm inveja dos brasileiros.
"Eles têm inveja da roupa que seus filhos vestem, do padrão de vida que você leva. Isso os incomoda. Eles não sabem o quão abençoados são de nascer num país desse. Porque a gente vem para cá sem falar a língua, sem saber nada, trabalha e ganha dinheiro. E hoje, na economia de Riverside, quem detém o poder econômico são os imigrantes", diz Sérgio.
O medo se espalhou por outras cidades, como Danbury, bem mais ao norte. Só neste ano, mais de 20 brasileiros já foram presos e deportados. A família do administrador de empresas Geraldo de Souza já foi acordada duas vezes por policiais batendo na porta, procurando outro brasileiro que morava no mesmo endereço.
"Eu passei uma semana sem dormir. Acordava entre 2h e 4h, pensando. Parecia que alguém ia bater na porta. Ou eu tirava isso ou ia embora para o Brasil. Mas o que eu ia fazer no Brasil? Imigrante ilegal aqui se sente inseguro todo o tempo", diz Geraldo.
O paraense João Rocha trabalha num centro católico e reza para não ser preso de novo como foi ao entrar no país. "Eu fui algemado pelos pés, braços e pela barriga. No terceiro dia, fui à Corte amarrado. Outras 40 pessoas foram amarradas junto comigo", lembra. João aconselha: "Não venha ilegal, porque quem vem ilegal sofre".
Há dois anos sem ver a mulher e as filhas, João sofre ainda mais com a saudade. "Neste mundo aqui, só restam carta e fotos.
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Humor - I dialed a number and got the following recording:
"I am not available right now, but thank you for caring enough to call. I am making some changes in my life. Please leave a message after the beep. If I do not return your call, you are one of the changes."

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